Vicente de Paulo nasceu em 1581, na cidade de Pouy, Landes, no sul da França, e foi batizado no mesmo dia. Foi o terceiro filho de um casal de camponeses muito fervorosos, e sua mãe educou os seis filhos no catolicismo. Já em criança, Vicente ajudava nos trabalhos familiares, principalmente nos cuidados ao rebanho.
O século da sua vida foi conhecido como um apogeu francês, destacando-se o reinado de Luís XIV, o “Rei sol”, cuja magnificência da corte ficou famosa. Mas na verdade a maior parte da realidade francesa era caracterizada por crianças abandonadas, prostituição, pobreza, guerras e revoluções internas, ignorância religiosa nas áreas rurais e lamentável estado de boa parte do clero.
Os pais de Vicente muito se esforçaram para que ele pudesse ter o melhor estudo possível, ao perceberem sua potencialidade, e com a ajuda de um benfeitor, o advogado Comet, ele teve a oportunidade de estudar com os franciscanos, e ao mesmo tempo educar os filhos dele. Aprendeu Humanidades na cidade de Dax, e em 1596, aos 15 anos, foi estudar Teologia em Toulouse, para o que seus pais venderam uma junta de bois. Ordenou-se sacerdote em 1600, e começou a dar aulas particulares para complementar a renda.
Uma senhora, viúva, que gostava das suas pregações e sabendo da sua difícil condição financeira, deixou-lhe em herança uma propriedade e certa quantia de dinheiro, que estavam só os cuidados de um comerciante na cidade de Marselha. Vicente prontificou-se a viajar até lá para receber e doar o valor total aos pobres, e na volta, embarcando de Marselha para Narbonne, seu navio foi capturado por piratas turcos, que o venderam como escravo em Túnis, na Tunísia, África.
Foi revendido a outro homem, que ao morrer o incluiu como herança para um sobrinho fazendeiro. Este era um ex-católico que, por medo da perseguição muçulmana, adotara o islamismo; uma das suas três esposas encantou-se com as músicas que Vicente cantava ao rezar, e pediu-lhe que explicasse o significado do que dizia.
Assim evangelizada, repreendeu o marido por ter abandonado aquela religião… o patrão se arrependeu e voltou à Fé católica. Em 1607, este homem e Vicente foram juntos para a França, escondidos dos muçulmanos, chegando a Paris em 1608. Em Avignon, o vice-legado do Papa concedeu de volta a Vicente as suas credenciais sacerdotais, e seu companheiro entrou para a vida monacal.
Nomeado capelão da rainha Margarida (Margot) de Valois pelo rei Henrique IV, em 1610, assumiu também a função de esmoler, isto é, distribuidor de esmolas, e a assistência espiritual de um hospital. Em 1612 o bispo de Paris o nomeou vigário de Clichy, um bairro na periferia da cidade. Dois anos depois, recebe a função de educar os filhos do casal Gondi, uma das mais influentes famílias francesas, bem como do cuidado espiritual e pastoral dos serviçais da família, sete mil pessoas em inúmeras propriedades em solo francês.
Esta experiência lhe proporcionou constatar, por quatro anos, o abismo material e social, além do espiritual e moral, entre os mais e menos favorecidos. Desenvolveu-se nele assim a base do futuro carisma vicentino no modo de atender às necessidades dos mais pobres.
Em 1617, numa dessas propriedades, em Folleville, constatando a carência espiritual da população quanto à confissão, a própria marquesa de Gondi, sabendo da situação por Vicente, lhe pediu que orientasse os católicos do local para que buscassem o Sacramento da Reconciliação, e não se perdessem as almas. Depois de um famoso sermão, a procura pelo confessionário foi tão grande que se fez necessária a ajuda de outros padres da região. A marquesa também disponibilizou muito dinheiro para que Vicente instituísse uma obra de pregação quinquenal aos camponeses das suas terras.
Muito tocado pelas ocorrências em Folleville, e desejando um auxílio mais próximo junto à população, ele passou a trabalhar como pároco na periferia de Châtillon-le-Dombes, onde uma nova situação aconteceu, sendo também importante para definir os moldes da sua obra futura. Toda uma família encontrava-se doente, sem que pudessem cuidar uns dos outros, e passavam fome e necessidades. Ao saber disso, Vicente pediu, na homilia, ajuda para eles. De modo surpreendente, muitas senhoras providenciaram alimento e companhia à família, e Vicente determinou-se a organizar esta forma de caridade: surgiu a instituição das “Servas dos Pobres”.
Vicente voltou à casa dos Gondi, buscando mais auxílio para os camponeses. Nas suas relações com a nobreza em geral, soube tocar-lhe o coração para o cuidado dos mais pobres. Em seguida, foi para Paris, onde eram muitas as carências, onde repetiu e ampliou a atuação das senhoras de Châtillon-le-Dombes: as Senhoras da Caridade, Damas da Caridade, Confraria das Irmãs da Caridade ou Confraria da Caridade, hoje conhecida internacionalmente como Associação Internacional de Caridades, iniciada em agosto de 1617, foi oficializada em dezembro do mesmo ano, e era formada por senhoras de posse que tinham tempo e recursos disponíveis para atender os menos favorecidos. As confrarias, rapidamente, se espalharam pelo país.
Em 1625 Vicente, também em Paris, fez uma nova fundação, a Congregação da Missão (Padres da Missão), também conhecidos como Padres Lazaristas (o nome vem da sua primeira casa, o Leprosário de São Lázaro), com o auxílio financeiro da família Gondi. Seu carisma é voltado principalmente para a evangelização nas áreas rurais, e fazem o voto obrigatório de apostolado com os pobres, em qualquer lugar; atuam por missões populares, e também cuidam da direção de seminários, pois uma outra grande preocupação de Vicente era a boa formação dos padres, que por isso também criou seminários.
Assim, às terças feiras, pregava para os seminaristas, e recebia sábios e nobres que buscavam conselhos. Sempre que possível, de outubro a junho, todos os anos, Vicente ia pessoalmente pregar nas áreas rurais. Em Paris fomentou ardentemente a prática dos Exercícios Espirituais de Santo Inácio de Loyola (nos quais se preparara em anos anteriores), principalmente entre o clero.
Em 1633 Vicente fundou outra congregação feminina, inovadora para a época, que em tempo recorde obteve a aprovação do Bispo de Lyon. As Filhas da Caridade (“Irmãs Vicentinas”), ainda hoje a maior família religiosa feminina da Igreja, não atuam como monjas dedicadas à contemplação monástica, mas “terão por mosteiro as casas dos enfermos, por cela um quarto de aluguel, por capela a igreja das paróquias, por claustro as ruas da cidade ou as salas dos hospitais, por clausura a obediência, por grades o temor de Deus e por véu a santa modéstia”. Este modo de atuação visava cooperar e ampliar os trabalhos das Damas da Caridade, e teve por cofundadora Santa Luísa de Marillac.
São Vicente de Paulo faleceu em Paris, aos 27 de setembro de 1660, com a idade de 79 anos, tendo participado ativa e decisivamente na reforma católica do século XVII na França. Seu corpo, exumado 52 anos depois, foi encontrado incorrupto, e está exposto à visitação na Capela de São Vicente de Paulo, em Paris; o coração está conservado em um relicário na Capela de Nossa Senhora da Medalha Milagrosa. Ele é o patrono de todas as Associações católicas de caridade, e também, na França, da Assistência Pública.
As três fundações de São Vicente inspiraram muitas outras com o seu carisma, de modo a Família Vicentina é o conjunto de congregações, organismos, movimentos, associações, grupos e pessoas que, de forma direta ou indireta, prolongam no tempo a sua obra de dedicação no serviço aos pobres. Está presente nos cinco continentes, com mais de 225 ramos incluindo religiosos e leigos. Os mais conhecidos são, além das três fundações originais, a Sociedade de São Vicente de Paulo (também conhecida por Conferências de São Vicente de Paulo ou Conferências Vicentinas, para leigos, fundada pelo beato Frederico Ozanam em 1833, Paris), a Associação da Medalha Milagrosa, a Juventude Vicentina Mariana e os seculares Lazaristas.
A Família Vicentina cuida dos abandonados, órfãos, idosos, inválidos, doentes, moças em perigo, sendo talvez a instituição católica e cristã, dedicada à caridade pura, de maior extensão geográfica e no tempo, agindo em leprosários, orfanatos, hospitais, escolas, manicômios, asilos, etc.. Os vicentinos possuem um imenso acervo escrito do seu fundador, embora ele não tenha se dedicado ao labor literário; são correspondências (só 400 forma para Santa Luísa de Marillac) e documentos redigidos por ele ou alocuções e conferências suas anotados por outros.